.

Posse

Pronunciamento de Posse de Flávio Mello[1] à Academia de Letras da Grande São Paulo, em 25 de Agosto de 2011, na Cadeira 02, patrono Olavo Bilac.

Leia também o texto de apresentação


Ilustríssima Acadêmica Senhora Gioconda Labecca, digníssima Presidente da Academia de Letras da Grande São Paulo;
Ilustríssimo Acadêmico Senhor José Roberto Espíndola Xavier, digníssimo Vice-Presidente da Academia de Letras da Grande São Paulo;
Ilustríssimo Sr. Acadêmico Hildebrando Pafundi, amigo, padrinho e nobre apresentador;
A querida e presente Maria Aparecida Mancini Fedatto, nossa Cidinha;
Prezadas Autoridades presentes;
Prezados e Nobres Acadêmicos;
Prezados amigos e familiares.

A Sabedoria se deixa encontrar
A Sabedoria é radiante, não fenece,
facilmente é contemplada por aqueles que a amam
e se deixa encontrar por aqueles que a buscam.
Ela mesma se dá a conhecer aos que a desejam.
Quem por ela madruga não se cansa:
encontra-a sentada à porta.
Meditá-la é, com efeito, a perfeição da inteligência;
quem vigia por ela
logo se isenta de preocupações;
ela mesma busca, em toda parte, os que a merecem;
benigna, aborda-os pelos caminhos
e a cada pensamento os precede.[2]

Agradecimentos

 
...ainda sou um esboço do que Deus projetou.
Até hoje, era comum em minha vida me ver em um enorme salão luxuosamente decorado e tomado por silêncio, dotado de dezenas de portas, todas elas fechadas, e atrás de cada uma delas outros salões silenciosos, luxuosamente decorados e dotados de outras dezenas de portas tão bem fechadas quanto, vivia preso a uma gravura de Escher.
Hoje, mesmo diante de tantas portas que se cerram, curiosamente, uma delas se abre para mim, e dela uma brilhante e quente luz se espalha por toda a nave, assim como em meu corpo, iluminando e aquecendo minha alma. Essa luz, Senhoras e Senhores, vem da Graça de Deus, pois a Luz de sua Sabedoria é onisciente e infinita, meu amparo, e dos olhos, que agora vejo lagrimejados, das muitas pessoas que amo, muitas delas aqui presentes nesta noite tão importante para mim.

Pessoas como meus pais, que passo e passarei lutando para deixá-los cada dia mais orgulhosos, lutando para provar que tudo que fizeram por mim valeu e vale a pena. Meus irmãos, base de minha formação, que por mais distantes que estejamos, estão tão presentes que ainda posso sentir o cheiro de nosso quarto, de nossa infância, em minha memória. Meus sobrinhos, hoje são tantos, que me alegram e me fazem sorrir só por imaginar que existem. Meus amigos e amigas recentes e aqueles que caminham comigo nessa estrada do viver a tanto tempo, que escolhidos por Deus me ajudam a caminhar com passos firmes. Minha esposa, doce criatura, que me fez homem e me ensinou lições que jamais vou me esquecer e poder retribui-las à altura. As minhas filhas, minhas flores, meu Lírio e meu Copo de leite, que Deus sabiamente semeou em nosso jardim, elas nem bem cresceram e já fizeram de mim uma pessoa melhor, são elas o que tenho de melhor em mim.
Não posso me furtar, e deixar de recordar, meu falecido avô Arvidis Briedis, que veio da Letônia semear terras americanas, fez sua magnifica lavoura verdejar, hoje sou parte dessa colheita.
A todos que caminham comigo e que amo, e me perdoem se nesse momento de grande emoção me esqueci de alguém.

O porquê de fazer parte desta Academia


Lembro-me das palavras do grande artista, de quem tenho o maior apreço, e dedico parte de minha vida a pesquisa-lo, Jorge de Lima, ao se referir a Academia Brasileira de Letras, “[...] representa uma tradição, uma continuidade, uma fundação que dispõe das maiores garantias de perpetuidade.” [3] Faço minhas tais palavras, e vou além, estar aqui hoje é estar emoldurado e dependurado na parede do grande Salão da Literatura, do grande Museu chamado Arte e que tem Deus como seu maior curador.

Meu estimado Antecessor

Por cuidado e reverência, pois estou nesse momento entre os grandes, gostaria de saudar e trazer à luz meu antecessor o Confrade Luís Máximo de Souza, que após contato com a família, e a leitura de alguns textos, entre eles originais inéditos, compreendi o porquê de seu sobrenome Máximo, e o tamanho da responsabilidade que agora carrego, assim como os deveres aos quais me comprometo.
Luís Máximo de Souza autor de vários livros, foi um dos fundadores dessa Casa, Primeiro Secretário e amigo leal do saudoso Rinaldo Gissoni (Presidente e fundador da Academia de Letras da Grande São Paulo), foi o máximo como professor, sua paixão, amado pai, esposo, amigo e confidente, como também foi um grande como poeta, dobrando versos e os transformando em partículas de ouro. Obtive, por intermédio da família, textos magníficos do poeta, e dentre eles um texto escrito pelo Confrade Gissoni, por ocasião da morte de Máximo, texto esse carregado de saudosismo, respeito e admiração, que fez meu peito se encher de entusiasmo e orgulho pelas pessoas que fazem parte desse universo, ao qual hoje também farei parte.
Quero agradecer do fundo de meu coração a esposa do poeta Eulina de Barros Souza, a toda família Máximo, em especial ao Sr. Valter Máximo de Souza, que com muito carinho me ofereceu valiosas informações sobre o vulto que fora seu pai. Obrigado e ficam aqui cunhados meus agradecimentos, meu respeito e minha admiração.

Meu estimado Patrono
Hoje venho tomar posse à Cadeira de Número 2 que tem como Patrono o grande Príncipe dos Poetas, Olavo Bilac[4], homem que na poesia nos fez adentrar o cosmo e sentir o brilho e o poder das explosões das estrelas.

Olavo Braz Martins dos Guimarães Bilac, ou apenas, e já nos basta, Olavo Bilac, “o mais antológico dos nossos poetas” [5], foi além de poeta, cronista, ensaista, jornalista, grande orador, inspetor de ensino e um virtuose. Nasceu o poeta no Rio de Janeiro, no dia 16 de dezembro de 1865, e veio a falecer na mesma cidade, em 28 de dezembro de 1918. Foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, onde criou a Cadeira nº 15, que tem como patrono o grande romântico Gonçalves Dias.
Tentou ser médico, frustrou-se, assim como se frustrou nas leis ao tentar Direito, mas dedicou sua vida, desde muito cedo, ao jornalismo e à literatura, felizmente. Na politica e em atos cívicos sua figura elegante também circulou, foi fundador de jornais, como A Cigarra, O Meio, A rua... apenas para citarmos alguns. Apresentou sua visão classicamente “tupiniquim”. Tão clássico era Bilac, que na constelação em que viveu até mesmo o “Sol” substituiu, uma vez que na seção “Semana” da Gazeta de Notícias, foi o substituto de Machado de Assis, trabalhando ali durante alguns anos.

Salve, lindo pendão da esperança,
Salve, símbolo augusto da paz!
Tua nobre presença à lembrança
A grandeza da Pátria nos traz.[6]

Ao lado de Alberto de Oliveira e Raimundo Correia formou a tão complexa e perfeita triade parnasiana, e o requinte e beleza de sua obra tornou o artista Bilac uma celibridade de sua época, e foi eleito o “Príncipe dos Poetas Brasileiros”, pela Revista Fon-fon no primeiro dia de Março de 1913.
Olavo Bilac tinha em suas mãos o poder de transformar em literatura assuntos antagônicos, não apenas como o tão comparado ourives, mas um verdadeiro mago, um alquimista transformando assuntos banais, triviais, belos, sagrados... em palavras polidas e profundamente poéticas. Como no seguinte poema,

Sou como um vale, numa tarde fria,
Quando as almas dos sinos, de uma em uma,
No soluçoso adeus da ave-maria
Expiram longamente pela bruma.  

É pobre a minha messe. É névoa e espuma
Toda a glória e o trabalho em que eu ardia...
Mas a resignação doura e perfuma
A tristeza do termo do meu dia.

Adormecendo, no meu sonho incerto
Tenho a ilusão do prêmio que ambiciono:
Cai o céu sobre mim em pirilampos... 

E num recolhimento a Deus oferto
O cansado labor e o inquieto sono
Das minhas povoações e dos meus campos.[7]

E em noites frias

...estou aqui distante do turbilhão da rua, humildemente escrevendo, escrevente, escrevedor... o que resultou nesse discurso prosaico, que escrevi em madrugadas frias, tendo como trilha sonora o silêncio de minha casa cortado pelas contrações de minha filha caçula Beatriz e os sonhos angelicais de minha filha mais velha Alice... (entre fadas, bruxas, príncipes e dragões), minha esposa repousa em (e no) silêncio, faz coro a casa e as minhas reflexões.
Do claustro, no silêncio e no sossego,
Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua![8] 

Minha morada é meu templo. O coração das pessoas que amo é meu templo. Deus é meu templo. Ler, escrever, pesquisar... são meus templos. Minha família é meu templo. E hoje, irmãos e irmãs, essa Casa é meu templo.

Inúmeras vezes, em minha vida, ouvi daqueles infiéis e incrédulos "Ora (...) ouvir estrelas! (...)” como se fosse eu um louco, e mesmo que lhes dissessem que as ouvia, e as ouço, como ouço agora, ao abrir meu peito, ao abrir um livro. Ou mesmo a janela me deparando com o cosmos, com a silhueta do Ressuscitado (em todas as coisas), que ouço cada partícula do universo gritar aos meus ouvidos (em uma sinfonia de poesia e prosa), ao passo que me quedo pálido e anestesiado. Por isso sou escritor, por isso coso com palavras as cores e cheiros que as lapadas e lufadas de vento trazem à minha mesa de trabalho.
Atravesso sem medo a porta e adentro augusto este átrio (como o corvo de Poe), saio da sala dos passos perdidos, e me entrego por inteiro à Arte, ao Amor, à Fé e ao Passado, sim ao passado, de que essa Casa é dotada. A experiência dos membros dessa Academia é a argamassa que sustenta e dá cor a esse universo, que me deparo como o poeta[9] diante do esplendor de Mira-Celi. E tão maravilhado quanto ele, me dedicarei a ostentá-la, amá-la e lutar para que ganhe, na enorme constelação (seu futuro), o brilho e o poder que são emanados de seu ventre.
Graças a Deus a porta se abriu.
Quero dizer que ganho muito mais que apenas a Medalha e o Diploma, que abraços e afagos, ganho a graça de aprender, ouvir e degustar o que cada membro dessa Casa pode me oferecer, além é claro da irmandade e carinho, dividiremos o pão, o peixe, o vinho... algumas tristezas, sim é claro..., dividiremos amor, ideias, palavras, mas acredito que acima de tudo dividiremos ainda mais o Sopro Divino, demonstrando ao Criador a dignidade de sermos Seres Humanos.

Domamos palavras e agora diante de todos me quedo. 

Bibliografia utilizada: 

______. Bíblia de Jerusalém, São Paulo: Editora Paulus, 6ª impressão, 2010.
BANDEIRA, Manuel. Apresentação da poesia brasileira. Poesia Completa e Prosa. RJ: Nova Aguilar, 1986.

BOSI, Alfredo História concisa da literatura brasileira, São Paulo: Cultrix, 1994.
BUENO, Alexei, Jorge de Lima: poesia completa ; textos críticos, Marco Lucchesi... [ET al.]. – Rio de Janeiro : Nova Aguilar, 1997.

CANDIDO, Antônio; CASTELLO, José Aderaldo. Presença da literatura brasileira, (II Romantismo, Realismo, Parnasianismo, Simbolismo) DIFEL, 9ª Ed., 1979.
COUTINHO, Afrânio, A Literatura no Brasil ; codireção Eduardo de Faria Coutinho.  – 5. Ed. Ver. E atual. – São Paulo : Global, 1999.

http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?sid=184
JORGE, Fernando Vida e Obra de Olavo Bilac, São Paulo, T. A. Queiroz, Editor, 4ª Ed. 1992.



[1] Flávio Mello é o pseudônimo de Flávio Ferreira de Melo.
[2] Livro de Salomão, 2010, p. 1114.
[3] LIMA, Jorge, 1997, pg. 59.
[4] Obras: Poesias (1888); Crônicas e novelas (1894); Crítica e fantasia (1904); Conferências literárias (1906); Dicionário de rimas (1913); Tratado de versificação (1910); Ironia e piedade, crônicas (1916); Tarde (1919); Poesia, org. de Alceu Amoroso Lima (1957), e obras didáticas.
[5] BOSI, Alfredo, 1994, p. 226.
[6] Hino à bandeira letra de Bilac, Música de Francisco Braga.
[7] O Vale, poema de Bilac.
[8] A um poeta, poema de Bilac.
[9] Jorge de Lima em Anunciação e Encontro de Mira-Celi.




12/04/2018
Amigos e Amigas EM BREVE NOVIDADES

12/04/2018
Leve o Escritor, Palestrante e Professor Flávio Mello para sua cidade, Universidade, Escola ou Espaços Culturais - o autor tem em seu repertório inúmeras palestras e bate-papos sobre Educação, Literatura e Arte. saiba mais pelo blog

Para ler / ver

.

.

Web hosting for webmasters