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Para minhas
filhas
Queria
poder ter seus olhos, acordar pela manhã e ver o mundo como vocês os veem.
Seria lindo, seria mágico... eu seria um pai melhor. O tempo me fez desver
muitas coisas, ou a forma como eu as via... hoje desbotado o mundo se faz mais frio,
muitas vezes com sabor de papelão, se é que posso descrever esse sabor. O tempo
me fez mais frio, me fez desacreditar que os dias chuvosos vão passar, e que
esses mesmos dias chuvosos, também guardam em si sua beleza, mas essa beleza
escorre pelos telhados de barro e ruas lamacentas.
Eu sei que
não deveria ser assim... mas o que me sustenta, me mantem em pé é a fé que
depositam em mim, quando me chamam de pai, de herói, de amigo... ou mesmo
quando olham pra mim e começam a sorrir.
Eu sei que
deveria pensar diferente, mesmo por que, quando chego do trabalho são vocês que
me fazem sorrir e me fazem deixar de pensar em desistir. Quando me mostram os
desenhos feito a giz, nas paredes da casa, entre as flores rasteiras do jardim.
Riu quando
ouço vocês rindo do filhote brincando na sala, quando me chamam para ver a gata
dormindo entre os cobertores sujos no chão da lavanderia. Riu quando
transbordam de alegria, quando chegam a chorar de tanto rir quando estão
assistindo esses programas da TV, seus olhos se fecham, viram dois riscos
curtos, com espaços e cheio de estrelas.
Eu queria
poder enxergar o mundo novamente, como o enxerguei na idade de vocês, quando
olhava para cima e via o rosto do meu pai ao lado dos raios de sol, como quando
olham para mim, na mesma posição desses dois astros.
Eu queria
poder olhar as nuvens no céu e descrever as formas que elas revelam, como
quando vocês me mostraram aquela nuvem que parecia uma tartaruga nas
profundezas infinitas do céu. Eu queria olhar pra mim e ser a metade do que
vocês dizem que sou, eu queria, de verdade, ser o melhor pai, o melhor amigo, o
melhor homem... mesmo sabendo que não sou, mesmo sabendo que nunca serei.
Emprestem-me
seus olhos para que eu possa me amar como dizem que me amam.
Flávio
Mello
30/08/2019
sábado, 31 de agosto de 2019
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Categoria:
Crônica
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Embora a vida não me trate com amor, eu não me canso de viver, não me canso de querer ser da vida vivedor - Sérgio Cassiano!
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